Por Pedro Henrique Reynaldo
Alves, Presidente da OAB-PE, especial para o Blog de Jamildo
O nosso sistema judicial,
constitucionalmente concebido e modelado, é repartido entre as
responsabilidades da União Federal e dos Estados e Distrito Federal, competindo
à esfera federal custear o aparelho judiciário que trata, em apertada síntese,
das causas que envolvam interesse da Federação e também as causas trabalhistas,
enquanto que as causas comuns, entre particulares, aquelas que nascem do
cotidiano do cidadão em suas relações com outras pessoas, empresas ou com o
próprio Estado, são de competência da chamada Justiça Comum Estadual, cujos
orçamentos se sustentam em verba estadual.
O cenário da (in)eficiência
da justiça em nosso País não é nada bom, sendo que, ao analisarmos do ponto de
vista das justiças estaduais em geral, e em nosso Estado de Pernambuco em
particular, ele ganha contornos dramáticos. Isso em parte é reflexo da crise
federativa que vivemos, que revela um excesso de concentração de recursos
tributários na União Federal, e uma paulatina transferência de encargos sociais
para os Estados e Municípios.
Embora o desequilíbrio de
nosso pacto federativo tenha ganhado maior relevo e evidência nos últimos
tempos, em razão das medidas de desoneração tributária adotadas como política
fiscal, pela Presidência da República, para prevenir um desaquecimento da
economia do País, que ensejou conseqüente queda nos repasses estaduais (FPE) e
municipais (FPM), a concentração exacerbada de recursos no orçamento da União
se deu há muitos anos, desde o desvirtuamento das receitas constitucionalmente
destinadas à seguridade social (PIS, CONFINS, CSLL, ex-CPMF etc.), cuja
arrecadação não é compartilhada com os demais entes federativos.
Com o orçamento da União
“turbinado”, naturalmente os duodécimos que nutrem os orçamentos do Poder
Judiciário Federal são suficientes para manter boas estruturas, com fóruns
melhor estruturados, serventuários melhor remunerados e, por conseqüência, mais
qualificados, menor déficit de juízes e auxiliares etc.. Por outro lado, os
Judiciários estaduais, a exemplo do de Pernambuco, amargam uma situação de
penúria que compromete a própria prestação jurisdicional. E não estou falando
aqui apenas em demora na prestação jurisdicional – eterno problema que
desacredita nossa justiça – mas num problema bem maior que é a simples falta da
justiça.
Em recente viagem pelo
Sertão de nosso Estado tomei conhecimento, através dos legítimos reclamos de
nossos colegas advogados, que a cidade de Floresta, com seus cerca de 30 mil
habitantes, está sem Juiz de Direito, recebendo a visita de magistrado substituto
uma vez por semana. Justiça por lá apenas às terças-feiras, como se os
conflitos e demandas jurídicas pudessem ser programados para um dia só na
semana, e, ainda, que um único magistrado fosse capaz de resolvê-los em apenas
um expediente semanal. Ano passado, ao visitar São José do Belmonte, fui
informado que após 5 (cinco) anos sem juiz, aquela Comarca passou a dispor de
um magistrado, para alívio daquela comunidade. E a situação se replica em
diversas Comarcas de Pernambuco.
Não é preciso ser nenhum jurista
ou sociólogo para saber o grande prejuízo social advindo da falta de juiz em
uma cidade. Além das causas que não andam, ou sequer se instauram, em razão do
descrédito da justiça, cidades sem juiz se ressentem de uma importante
referência de autoridade pública. Como não existe vácuo no poder, a ausência do
Judiciário nas cidades certamente se traduz num excesso (ou mesmo abuso) de
poder de autoridades policiais, em uma afronta à cidadania e ao Estado de
Direito. Que me perdoem os Ministros e Desembargadores, mas em verdade, cada um
deles, que integram um órgão colegiado, são muito menos importantes que o Juiz
do interior, referência única do Poder Judiciário em toda uma coletividade.
E se faltam cerca de 150
juízes em nosso Estado, o que dizer dos 250 Defensores Públicos faltantes na
carreira ?! Já que não adianta termos Julgador sem a presença de advogado, e
que compete aos Defensores Públicos responder pela maior parte das demandas da
sociedade por justiça, advindas que são das classes menos favorecidas, a
solução do caos de nosso sistema passa pelo fortalecimento também da
Defensoria, que em Pernambuco, além da falta de quadros, conta com a segunda
pior remuneração do País.
Repito aqui o que venho
afirmando com insistência: enquanto nossos dirigentes enxergarem as despesas e
repasses orçamentários para os serviços da justiça como custeio da burocracia
estatal, ao invés de investimento em cidadania, continuaremos vivenciando o
atual e caótico “faz de conta” de nosso sistema judicial.
Em tempos de rediscussão do
nosso pacto federativo, cabe refletirmos também seus efeitos nos demais poderes
da República, sob o prisma do fortalecimento dos órgãos públicos que integram o
sistema judicial (Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública),
responsáveis juntamente com a advocacia pela realização da justiça e da
cidadania neste País.
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